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Coerção sexual, abuso psicológico e estelionato: o que dizem as vítimas de guru em Viamão

13.12.2024 17h37  /  Postado por: luantavares6930

Mais de 20 pessoas já buscaram a Polícia Civil para atribuir crimes ao líder da comunidade Osho Rachana, em Viamão. As denúncias são de tortura psicológica, coerção sexual, estelionato, curandeirismo e agressão física. Além disso, a presença de menores de idade no entorno da seita pode configurar infrações ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O principal investigado é um homem, de 69 anos, conhecido como Prem Milan. Ele seria responsável por coordenar o grupo, que tinha como base um sítio no bairro Cantagalo. O local foi alvo da Operação Namastê, na quarta-feira, quando houve a apreensão de documentos, computadores, celulares, máquinas de cartão e fotografias.

De acordo com a delegada Jeiselaure de Souza, responsável pelo caso, Milan teria desviado cerca de R$ 20 milhões dos seguidores, e contraído dívidas que ultrapassam R$ 4 milhões. Dois filhos dele também são investigados.

As vítimas pedem a prisão do suspeito, alertando para o risco de fuga e a possibilidade de coação de testemunhas. Contudo, a defesa do guru, além de negar os delitos, garante que ele está à disposição das autoridades.

Os membros do culto tinham fichas de cadastro com dados pessoais, como endereço e telefone de familiares, o que gera medo de retaliações a ex-integrantes. Apesar do temor, eles descreveram, sob a condição de anonimato, os abusos sofridos. Todos os relatos abaixo constam na Polícia Civil e no Ministério Público Estadual.

Tortura psicológica e ruptura com familiares

O grupo promovia “terapias bioenergéticas”, um misto de análise com exercícios respiratórios. As práticas ocorriam em sessões individuais, onde um integrante fazia relatos de cunho íntimo a outro, que atuava como terapeuta. O preço das consultas era R$ 800 por mês.

As confissões eram ditas em caráter particular. Os relatos, porém, acabavam servindo para humilhar publicamente os filiados que contrariavam a seita.

Um ex-paciente alega ter sofrido chantagens quando tentou deixar a comunidade. Na presença de outros colegas, ele foi alvo de palavrões e confrontado com os segredos que havia revelado a uma “terapeuta”, no caso, a filha de Prem Milan.

“Ela disse que eu era um b***, além de ser fraco, por querer sair da comunidade. Depois, passou a me ofender com base em traumas de infância e de ex-relacionamentos que tive. Eram informações que tinham sido reveladas em uma sessão particular, mas acabaram servindo para me humilhar na frente dos outros. Isso sempre acontecia quando alguém contrariava os interesses da seita. O objetivo era manipular e coagir as pessoas, através da difamação e atos vexatórios”, explica.

Outro tipo de imersão com contornos psicológicos era intitulada “Pai e Mãe”, que chegava a custar R$ 10 mil. A atividade tinha prazo de até três semanas, e visava incutir nos participantes a noção de que traumas e frustrações decorriam da criação no seio familiar. A orientação era romper laços com os parentes.

Coerção sexual de vítimas

A fragilidade emocional extraída em terapias também assumia conotações sexuais. O grupo atribuía a felicidade ao sexo irrestrito, praticado em alguns tipos de imersão e no cotidiano da comunidade.

Os relatos dão conta que as lideranças tinham aval para estabelecer um número determinado de pessoas para um integrante ter relações. A justificativa era que a atividade sexual resolveria traumas e problemas de ordem psicológica.

Caso um filiado não conseguisse ou não quisesse fazer sexo, novamente era confrontado com informações que havia dito em sessões de terapia. A pessoa que tivesse uma frequência sexual considerada baixa seria alvo de ofensas que incluíam atributos físicos, como peso e aparência. Mulheres eram a maior parte das vítimas.

“O Milan e seu séquito esculachavam as pessoas com base na aparência e no que tinham ouvido em terapias. Se alguém não fazia sexo, era porque estava acima do peso ou tinha traumas. A maior parte dos alvos eram mulheres, principalmente as mães, que eram extremamente maltratadas”, descreve uma vítima.

Agressões físicas e verbais

A raiva e o ódio eram vistos como fatores motivacionais. Os xingamentos seriam uma maneira de “limpar a alma”. Isso incluía, mais uma vez, ofensas com base em aspectos físicos e fragilidades psicológicas.

Houve casos de agressão corporal. Um episódio do tipo aconteceu em uma partida de futebol, e foi presenciado por dezenas de espectadores. O jogo integrava o cronograma da Gincana Namastê, uma maratona de atividades ao longo de uma semana, e que custava R$ 2 mil.

Na ocasião, Prem Milan era, ao mesmo tempo, juiz e treinador de dois times. Ele teria discutido com um jovem que questionou a duração do jogo. Em meio ao bate-boca, o guru agrediu o rapaz com um forte tapa no rosto.

“O Milan desferiu um ‘tapão’ na cara do garoto, que não devia ter mais de 18 anos. Por incrível que pareça, a agressão foi justificada por outros seguidores. O argumento deles era que as palavras do jovem contra o líder doíam mais que violência física”, pontuou uma testemunha.

Estelionatos, extorsões e jogos de azar

Parte das vítimas pagava valores mensais para morar na comunidade. Os moradores sem condições financeiras tinham que abrir mão do lucro obtido com a venda de agendas, cadernos e pão artesanal.

O sítio em Viamão chegou a abrigar 120 pessoas mas, nos últimos meses, somava cerca de 60 moradores. A cobrança de dinheiro teria ficado mais intensa após a pandemia.

Segundo a delegada Jeiselaure de Souza, Milan começou a pregar que o mundo estava próximo do fim. O homem teria demandado que os seguidores fizessem o maior número possível de empréstimos no período.

“Ele falava que a pandemia era o fim do mundo e orientou os seguidores para que ‘estourassem’ os cartões de crédito. Teve gente que transferiu empresas para a posse dele, outros financiaram carros e tratores. Em um dos casos, uma vítima fez empréstimos de R$ 300 mil. As pessoas foram orientadas a cortar vínculos com amigos e família, depois faliram e perderam a independência financeira, e assim elas acabavam em um ciclo vicioso e não conseguiam mais sair”, ressaltou a delegada titular da 1º DP de Viamão.

Milan teria revertido as contribuições em proveito próprio. Parte da quantia foi investida em empresas e imóveis dele. Ele também teria bancado viagens de luxo, com destino a países da Europa. O montante ainda foi destinado para apostas em jogos online.

A estimativa é que o total desviado chegue a R$ 20 milhões. Além disso, as vítimas somam prejuízo superior a R$ 4 milhões, fruto de dívidas contraídas pelo suspeito.

Presença de crianças no entorno da seita

Ainda não há relatos de abuso sexual infantil no inquérito. Entretanto, é investigado se houve exposição de crianças a atos sexuais.

Na Operação Namastê, foram apreendidas imagens em que menores de idade aparecem nus. Os materiais ferem os artigos 241-B e E do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que tipifica como crime fotografar ou armazenar cenas de nudez envolvendo crianças e adolescentes. A pena é de até quatro anos de prisão, mais multa.

“Essa é uma questão muito delicada, e que está em apuração. Fato é que o ECA proíbe armazenar imagens de crianças nuas. Estamos averiguando o intuito disso, ainda não temos uma conclusão”, ponderou a delegada Jeiselaure de Souza.

De acordo com um ex-integrante da comunidade, houve uma época em que Prem Milan chegou a incentivar que crianças observassem os pais durante o ato sexual. A indicação, entretanto, não teria vigorado por muito tempo.

“Teve um período em que o Milan incentivava que as crianças espiassem as relações sexuais dos pais. Após perceber que isso sairia de controle, ele parou com a orientação”, consta o relato.

Leia a nota da defesa do suspeito

A defesa técnica de Adir Aliatti, realizada pelo advogado Rodrigo Oliveira de Camargo, refuta a hipótese levantada pelos denunciantes e, desde as primeiras reportagens, já se colocou à disposição das autoridades. Aliatti confia na justiça e não se furtará de prestar todos os esclarecimentos devidos nos foros e momentos adequados. Até onde teve conhecimento dos fatos investigados, a materialidade na narrativa não se sustenta por falta de elementos.

Correio do Povo

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