Por Jânio Stefanello: Internet no campo, um desafio que envolve cooperativas e o poder público

Jânio Vital Stefanello
Presidente da Coprel e da Confederação Nacional das Cooperativas de Infraestrutura (Infracoop)
Vivemos em um mundo absolutamente conectado, em que a internet faz parte de praticamente todas as nossas atividades diárias. Somos apresentados às tecnologias do Agro 4.0, falamos sobre a chegada do 5G, estamos no início da era da Internet das Coisas, mas, ao mesmo tempo, 70% das propriedades rurais no Brasil não possuem acesso à internet, de acordo com o último Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Esse universo de famílias rurais que está offline não consegue se utilizar das ferramentas de comunicação na internet para apresentar suas demandas. O setor cooperativo já viu esse filme antes. No roteiro, estava a questão da eletrificação rural. Na década de 1960, o acesso à energia elétrica no Interior era tão ou mais deficitário do que a questão da internet nos dias atuais. O cooperativismo foi a chave que abriu as porteiras do campo para o desenvolvimento proporcionado pela energia elétrica. As cooperativas de eletrificação rural buscaram financiamentos e tiveram a participação dos seus associados. O setor agropecuário gaúcho se desenvolveu de forma expressiva nas décadas seguintes, pois as cooperativas do Sul se destacaram em sua atuação.
Atualmente, os mesmos atores (famílias rurais e cooperativas) unem esforços e buscam recursos para viabilizar o acesso à internet de qualidade no campo. No entanto, os desafios parecem ainda maiores e se iniciam pela própria regulamentação das atuações das cooperativas no setor de telecomunicações. Hoje, as cooperativas não possuem segurança jurídica para atuarem no setor, e a solução encontrada para atender às reivindicações dos associados foi a criação de empresas limitadas com capital social controlado pelas cooperativas, a fim de viabilizar a realização de projetos de internet rural.
No caso da Coprel, estamos em diálogo constante com as prefeituras, sindicatos e outras cooperativas, em uma atuação conjunta para viabilizar a construção de redes de fibra ótica no Interior. Já construímos projetos com cooperativas de crédito para financiar a instalação de internet rural com juros menores, subsidiados pela Coprel. Muitas prefeituras já incluíram programas de acesso à internet rural em seus projetos de governo e estão dando passos importantes na universalização do acesso em seus municípios, como é o caso de Ibirubá, Marau, Passo Fundo, Gentil, Tapera, Quinze de Novembro, Fortaleza dos Valos, Selbach e Soledade. Mas, para viabilizar e efetivar projetos mais abrangentes, precisamos de uma política de Estado, com destinação de recursos do orçamento da União para projetos de interiorização do acesso à internet de qualidade em todo o país, de forma semelhante ao que foi realizado com a eletrificação rural ao longo da década de 1970.
Para viabilizar e efetivar projetos mais abrangentes, precisamos de uma política de Estado, com destinação de recursos do orçamento da União para projetos de interiorização do acesso à internet de qualidade em todo o país, de forma semelhante ao que foi realizado com a eletrificação rural ao longo da década de 1970.
A importância da internet de qualidade para o Interior é indiscutível, mas não podemos deixar de elencar os pontos primordiais da necessidade por comunicação de qualidade no campo. A educação e a formação a distância é uma realidade, e não somente em função da pandemia. Realizar uma formação universitária remota é a alternativa de muitos jovens que durante o dia trabalham na propriedade e à noite se dedicam aos estudos (o que é determinante para a permanência dos jovens no Interior). A nota fiscal eletrônica, que já é uma exigência para muitos produtores, precisa muitas vezes ser emitida em escritórios contratados quando não há acesso à internet no campo. Outro aspecto é a segurança: redes de fibra ótica permitem a instalação de robustos sistemas de videomonitoramento.
Em meio a todos os desafios do setor de telecomunicações, a Coprel e o setor cooperativista estão deixando a sua contribuição, com recursos próprios, participação dos associados/cooperantes e por meio de parcerias público-privadas. Esses esforços conjuntos já possibilitaram que mais de 9 mil famílias rurais tenham acesso à internet da Coprel. Mas ainda temos um universo de famílias que aguardam ansiosas a chegada da internet em suas propriedades. Sabemos que o acesso à comunicação é fundamental para a sucessão familiar e o investimento em melhorias nas atividades para agregar e gerar mais renda. O futuro do agro é online. E o cooperativismo está conectado para fazer esse futuro acontecer.
FONTE: GAÚCHA ZH